24 de maio de 2010

APEGO

Meu pai era filho de imigrantes. Trabalhou desde menino, e durante a maior parte de sua vida adulta , teve dois empregos. À noite, muitas vezes adormecia na poltrona, os pés numa bacia de água morna,exausto demais para conversar.Sempre trabalhara para outras pessoas, acatando as condições delas , em funções dos objetivos delas. Uma das primeiras coisas de que me lembro é meu pai me dizendo o quanto é importante ser patrão de si mesmo, estar no controle da própria vida.

Eu estava com quase vinte anos quando ele e mamãe compraram uma casinha em Long Island, e ele se aposentou. Por um momento, seu sonho parecia completo.

Alguns meses depois de ele tomar posse da nossa casa, fui fazer uma visita num domingo e o encontrei dormindo na poltrona, exausto.Uma visão familiar desde a infância para mim, mas eu estava pensando que as coisas tinham mudadOo. Minha mãe contou-me que ele acabar de arrumar um empreguinho, só para poderem manter o lugar em ordem. As coisas estavam sempre se deteriorando.

Na visita seguinte, ele estava de novo dormindo na poltrona.

"Vocês estão se divertindo
?"- perguntei.
"Bem" disse mamãe- "Seu pai teme que alguém arrombe a casa e leve tudo o que trabalhamos para ter.Ele continua a trabalhar, pois quer instalar um sistema de alarme"

Desanimei. Perguntei quanto aquilo custaria. Minha mãe fugiu do assunto e disse que o comprariam em breve . Meses depois, meu pai continuava a parecer esgotado. Preocupada, perguntei quando eles tirariam férias.
Meu pai sacudiu a cabeça .

"Não neste ano- não podemos deixar a casa sozinha
."

Sugeri um caseiro. Meu pai ficou horrorizado .

-Ah, não -replicou "Você sabe como são as pessoas.Nem nossos amigos cuidam das nossas coisas do mesmo jeito que cuidam das deles".

Nunca mais meus pais tiraram férias.

No final, eles raramente saiam de casa juntos , nem para ir ao cinema. Podia haver um incêndio ou algum outro tipo de desastre vago e indefinido. E meu pai trabalhou fazendo bicos até morrer. A casa acabou tendo muito mais controle sobre ele do que qualquer um de seus ex-patrões tivera.

Se temermos demais a perda, no final as coisas que possuímos acabarão por nos possuir.


Retirado do livro
"HISTÓRIAS QUE CURAM", de Rachel Naomi Remen